WOLF,
Eric W. 2003. “Tipos de Campesinato
Latino-Americano: Uma Discussão
Disciplinar”. In: Antropologia e Poder,
Brasília/Campinas: EdUnB/Editora Unicamp.
Conhecer a trajetória de Wolf é
particularmente interessante para mim, pois, há um ano, quando comecei a me
interessar pelas questões ambientais na antropologia eu busquei por autores que
não conhecemos em Teoria Antropológica 1 e 2. Foi então que descobri o
neoevolucismo e a ecologia cultural. Descobri que o que estudamos nas
disciplinas citadas anteriormente é apenas um pedacinho das discussões sobre
antropologia que existem pelo globo. Percebi também a influência que o
posicionamento político dos autores tinha sobre a sua inclusão ou não nos
currículos das matérias teóricas. Que a ecologia cultural era uma vertente em
voga entre antropólogos "à esquerda" no espectro político norte americano.
Li textos originais de Leslie White, Julian Steward e na sequência, entre os
orientandos Roy Rappaport e Eric Wolf, acabei optando pelo primeiro. Fui
conhecer um pouco de diferentes interpretações para rituais como expressão
social e religiosa de controle sobre o meio ambiente, estudos sobre consumo e
produção de calorias, etc. desaguando em alguns brasilianistas como Emílio
Moran, já na vertente de estudos da adaptabilidade.
Wolf produziu em paralelo a esses autores,
numa linha mais próxima de Gonzalo Aguirre Beltrán e Ángel Palerm, todos numa
vertente política socialista. Do diálogo com Sidney Mintz aprofunda-se as
investigações sobre o mundo rural com foco nas diversidades locais e os modos
diferentes através dos quais pressões capitalistas foram vivenciadas por
populações específicas. Esse é o contexto de publicação de "Tipos de
Campesinato na América Latina". O objetivo do texto é delimitar uma
tipologia de grupos camponeses latino americanos reorientando a investigação
antropológica de foco culturalista para dedicar especial atenção à estrutura
desses grupos camponeses.
O autor abre mão da caracterização
genérica do campesinato e opta por definir camponês como produtor agrícola que
retém o controle efetivo de sua terra com fins de subsistência. Afirmando a
importância do fator histórico e econômico sobre um cenário local -
principalmente em uma América Latina disputada por potências mundiais -, Wolf
reforça a importância de observar a relação estrutural da comunidade que os
camponeses desenvolvem e reforçam para manter seu núcleo socio cultural integro
na medida em que se relaciona com um componente externo maior (a cidade, o mercado,
o modo de produção capitalista, etc.). Nesse sentido, para Wolf, é necessário
observar os campesinatos como culturais parciais.
Partindo de exemplos de base empírica,
Wolf propõe as noções de comunidades corporadas e comunidades abertas. As
comunidades corporadas são comumente localizadas em terras altas, normalmente
marginais, exploradas por meio de uma tecnologia tradicional (envolvendo
predominantemente o componente físico). Esses fatos interferem diretamente
sobre a capacidade de produção da comunidade e acabam tendo por consequência a
pobreza, reforçada pela limitação da capacidade de consumo de bens externos.
Dificilmente o chefe familiar diferencia o que é fruto de seu trabalho de
outros tipos de renda. A terra é de propriedade comum, abrindo possibilidade de
redistribuição quando necessário. As principais decisões são tomadas dentro do
sistema político-religioso apoiado na família nuclear, que define as fronteiras
e é fator de coesão social, instituindo mecanismos de nivelação e controle que,
no limite, reforçam a integridade da estrutura. É comum a rejeição ao
estrangeiro ou forasteiro, com o objetivo último de reduzir a ameaça à integridade
da comunidade e expressão a adesão cultural ativa dos membros do grupo
camponês.
Já comunidades abertas abarcam várias
subculturas, sendo o campesinato apenas uma delas. Essas comunidades produzem
com o objetivo de vender. As relações de troca (compra e venda) são construídas
a partir de alianças informais entre famílias e clientes. Estão localizadas em
planaltos baixos e úmidos ou terras baixas tropicais e há tendencia para
ocupação marginal e adoção de tecnologia primitiva (que pode ser alterada a
depender do crédito fornecido pelo especulador externo, influenciando também
sobre a alternância entre tipos de produção). Há capitalização, mas em pequena
escala e intermitente. A interação com o mundo externo é intensa e incentivada,
pois os fatores de coesão social são diferentes e a demanda por produtos
externos é elevada. Wolf faz uma ressalva para a possibilidade de alternância
entre produção para subsistência e produção para venda, a depender das
necessidades da comunidade e condições do mercado externo. Essa alternância
caracteriza um mecanismo ativo da comunidade. Nos dois casos o ritmo de
mudanças é lento.
Por fim, Wolf traz outros cinco tipos de
camponeses, mas não os aprofunda pela carência de dados empíricos. Além disso,
o autor não exclui a possibilidade de revisão dos tipos definidos, muito menos
a possibilidade de descoberta de novos tipos. O ponto principal é a defesa de
uma análise baseada no estudo da estrutura da comunidade.
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