GUIMARÃES, Alberto
Passos. 2009. “Formação da pequena
propriedade: intrusos e
posseiros”. In: WELCH, Clifford Andrew; et alli (Orgs.). Camponeses brasileiros: leituras e
interpretações clássicas. V. 1.
São Paulo: Editora UNESP; Brasília, DF: NEAD. (pp. 45-55).
O texto de Alberto Passos faz uma síntese
dos três séculos de lutas das populações pobres do campo contra os senhores da
terra. Observando os quase 400 anos de latifúndio, são descritos os mais
variados meios utilizados para impedir que oprimidos e excluídos tivessem
acesso a terras. E mesmo quando resistiam, eram expulsas sob justificativa
econômica de uma suposta dilatação necessária dos cultivos ou das criações dos
grandes senhores. Mesmo quando esses camponeses pobres conquistavam pequenos
pedaços de terra para a agricultura de subsistência, o objetivo era único:
manter uma reserva de mão-de-obra dentro ou próxima dos latifúndios.
Feita essa introdução, caminhamos para uma
análise histórica mais específica, observando como as versões para o
aparecimento da pequena propriedade são pouco fundamentadas e como a história
escrita até então servia para fortalecer o latifúndio. A exemplo da história
construída entorno da colonização estrangeira instituída ao sul durante o
século XIX, que tenta ocultar o processo histórico anterior e pregar a divisão
de terras como um presente das classes dominantes, supostamente interessadas em
dividir parte de seu poder com camponeses pobres. Outro exemplo citado diz
respeito ao discurso elitista, popular no final dos oitocentos, de que a camada
oprimida da população vivia na preguiça ou “indolência”, sendo incapazes de
trabalhar. Como objetivo última dessas histórias, Guimarães localiza o
apagamento da história da longa e obstinada batalha da classe camponesa.
Em seguida, passamos a conhecer um pouco
melhor das balizas políticas e ideológicas que operaram o fortalecimento da
grande propriedade. Primeiro a “colonização sistemática”, que se fundava no princípio
de que as terras virgens não deviam ser postas ao alcance das populações pobres
por preços baixos para assegurar reservas de braços aos senhores, estabelecendo
preços altos para que a terra não pudesse ser adquirida com facilidade pelos
pobres do campo. Entretanto, esse princípio só será necessário com a chegada do
século XX, pois até então a terra no Brasil era um privilégio de poucos.
Tínhamos, há época do Brasil colonial e
mesmo no Império, uma aristocracia rural que não apenas possuía o privilégio de
casta sobre a terra, mas dominava e conduzia os meios jurídicos, as doações e
as ocupações pela força. Por esse prisma é que se enaltecia a figura do colono,
do bandeirante, do caçar de indígenas etc. Entretanto, Guimarães demonstra que
mais importante que a figura do colono foi a figura do posseiro ou intruso,
principalmente o posseiro ou intruso nativo, que enfrentou ao longo de séculos
o poder latifundiário violando "suas draconianas instituições
jurídicas" e garantindo cada vez mais significância histórica á posse, que
passa a ser percebida como a "arma estratégica de maior alcance e maior
eficácia na batalha contra o monopólio da terra". Esses foram os pioneiros
da pequena propriedade camponesa, galgando inicialmente as terras de ninguém
nos intervalos entre as sesmarias, em seguida as sesmarias abandonadas ou não
cultivadas, e por fim, as terras devolutas e latifúndios mal explorados.
Esses "intrusos", indígenas,
negros e pobres, resistiram as condições opressivas vigentes nos primeiros séculos,
que nada mais faziam além de limitar a expansão da agricultura nos moldes
capitalistas (ou alguém conhece uma potência capitalista que não tenha
realizado a partilha de suas terras?). Cabe ressaltar, por fim, que esses
intrusos nem sempre receberam a devida atenção dos historiadores, sendo
retratados diversas vezes nos moldes dos senhores rurais da época: uma multidão
de desvalidos, “ociosos” ou “vadios”. Mas que, na realidade, constituíram
importante instrumento luta contra o latifundiário desde a segunda metade do
século XVIII e por todo o século XIX.
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