segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Fichamento - Formação da pequena propriedade: intrusos e posseiros

 

GUIMARÃES,  Alberto  Passos. 2009. “Formação  da  pequena  propriedade:  intrusos  e  posseiros”. In: WELCH, Clifford Andrew; et  alli (Orgs.). Camponeses  brasileiros: leituras  e  interpretações  clássicas. V. 1. São Paulo: Editora UNESP; Brasília, DF: NEAD. (pp. 45-55).

 

O texto de Alberto Passos faz uma síntese dos três séculos de lutas das populações pobres do campo contra os senhores da terra. Observando os quase 400 anos de latifúndio, são descritos os mais variados meios utilizados para impedir que oprimidos e excluídos tivessem acesso a terras. E mesmo quando resistiam, eram expulsas sob justificativa econômica de uma suposta dilatação necessária dos cultivos ou das criações dos grandes senhores. Mesmo quando esses camponeses pobres conquistavam pequenos pedaços de terra para a agricultura de subsistência, o objetivo era único: manter uma reserva de mão-de-obra dentro ou próxima dos latifúndios.

Feita essa introdução, caminhamos para uma análise histórica mais específica, observando como as versões para o aparecimento da pequena propriedade são pouco fundamentadas e como a história escrita até então servia para fortalecer o latifúndio. A exemplo da história construída entorno da colonização estrangeira instituída ao sul durante o século XIX, que tenta ocultar o processo histórico anterior e pregar a divisão de terras como um presente das classes dominantes, supostamente interessadas em dividir parte de seu poder com camponeses pobres. Outro exemplo citado diz respeito ao discurso elitista, popular no final dos oitocentos, de que a camada oprimida da população vivia na preguiça ou “indolência”, sendo incapazes de trabalhar. Como objetivo última dessas histórias, Guimarães localiza o apagamento da história da longa e obstinada batalha da classe camponesa.

Em seguida, passamos a conhecer um pouco melhor das balizas políticas e ideológicas que operaram o fortalecimento da grande propriedade. Primeiro a “colonização sistemática”, que se fundava no princípio de que as terras virgens não deviam ser postas ao alcance das populações pobres por preços baixos para assegurar reservas de braços aos senhores, estabelecendo preços altos para que a terra não pudesse ser adquirida com facilidade pelos pobres do campo. Entretanto, esse princípio só será necessário com a chegada do século XX, pois até então a terra no Brasil era um privilégio de poucos.

Tínhamos, há época do Brasil colonial e mesmo no Império, uma aristocracia rural que não apenas possuía o privilégio de casta sobre a terra, mas dominava e conduzia os meios jurídicos, as doações e as ocupações pela força. Por esse prisma é que se enaltecia a figura do colono, do bandeirante, do caçar de indígenas etc. Entretanto, Guimarães demonstra que mais importante que a figura do colono foi a figura do posseiro ou intruso, principalmente o posseiro ou intruso nativo, que enfrentou ao longo de séculos o poder latifundiário violando "suas draconianas instituições jurídicas" e garantindo cada vez mais significância histórica á posse, que passa a ser percebida como a "arma estratégica de maior alcance e maior eficácia na batalha contra o monopólio da terra". Esses foram os pioneiros da pequena propriedade camponesa, galgando inicialmente as terras de ninguém nos intervalos entre as sesmarias, em seguida as sesmarias abandonadas ou não cultivadas, e por fim, as terras devolutas e latifúndios mal explorados.

Esses "intrusos", indígenas, negros e pobres, resistiram as condições opressivas vigentes nos primeiros séculos, que nada mais faziam além de limitar a expansão da agricultura nos moldes capitalistas (ou alguém conhece uma potência capitalista que não tenha realizado a partilha de suas terras?). Cabe ressaltar, por fim, que esses intrusos nem sempre receberam a devida atenção dos historiadores, sendo retratados diversas vezes nos moldes dos senhores rurais da época: uma multidão de desvalidos, “ociosos” ou “vadios”. Mas que, na realidade, constituíram importante instrumento luta contra o latifundiário desde a segunda metade do século XVIII e por todo o século XIX.

 

 

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