segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Fichamento – Abril Despedaçado

 

“Abril despedaçado” (2001). Direção Walter Salles.

 

Abril Despedaçado é um filme suíço-franco-brasileiro de 2001, dirigido por Walter Salles e baseado no romance Prilli i Thyer de Ismail Kadare, adaptado por Karim Aïnouz. Se passa no sertão brasileiro, no ano de 1910, onde Tonho passa a ser estimulado pelo pai a vingar a morte de seu irmão mais velho, assassinado por uma família rival, em meio a uma rixa que as duas famílias conservam por disputas de terras. As duas famílias (Breves e Ferreira) encontram-se sofrendo continuamente com assassinatos de seus membros, no que parece uma reinvenção criativa do princípio de Talião: "O sangue tem o mesmo volume para todos. Você não tem o direito de tirar mais sangue do que o que foi tirado de você".

Tonho acaba por executar a vingança incentiva por seu pai, matando um dos filhos dos Ferreira, e se tornando o próximo alvo dos Ferreira. "Menino", irmão mais novo de Tonho - criança ativa e imaginativa, apesar da educação severa, isolamento brutal e pobreza extrema -, muda gradativamente a cabeça do irmão. O último empurrão que Tonho recebe para questionar seu destino vem de Clara - menina jovem, membro de um circo que passava pelo vilarejo -, pois vê ao lado dela possibilidades que não conhecia.

O interesse amoroso se aflora e Clara passa a viver com os Breves. A certa altura do filme, o jovem casal sai em uma viagem curta, intervalo suficiente para que os Ferreira realizassem sua vingança. Na ausência de Tonho, o Menino - que ganhou o nome de Pacu de Clara e seu padrasto - acaba sendo executado por engano. A morte da criança deixa o pai da família em fúria, que clama a Tonho por uma retaliação final. Porém, ao ver o que o ciclo de mortes causou a sua família, Tonho deixa a fazenda sem dizer nada. O pai considera o ato uma traição e tenta matar o filho, mas é dissuadido pela mãe.

Marcam o filme o fraternalismo, a vingança, o cenário patriarcal, precário, a dissolução das próprias identidades em função das tradições e costumes, principalmente familiares. A luta pela terra constitui outro fator importante, e aqui ela se dá pelo fato de que a fazenda já teria sido de uma família e agora era de outra, e assim sucessivamente ao longo das gerações, sendo definidas as terras mediante a morte de cada indivíduo da família rival.

Levando em conta o contexto da disciplina e os textos estudados até o momento, nota-se a rigidez da estrutura familiar, organizada e autossuficiente, com interpretações próprias e laços de parentesco, autoridade, força e justiça em um núcleo de convivência alheio ao poder estatal. O trabalho marca o tempo do filme, sendo pilar elementar da organização social do vilarejo. A moenda de cana, uma bolandeira, é um enorme relógio que marca um tempo inexoravelmente circular, no qual a continuidade é central, não havendo possibilidade de irrupções (avanços ou transformações). Os laços e a hierarquia família se baseia na submissão dos filhos aos pais, e destes a continuidade temporal, aos códigos de vingança e a terra.

 

Fichamento - Formação da pequena propriedade: intrusos e posseiros

 

GUIMARÃES,  Alberto  Passos. 2009. “Formação  da  pequena  propriedade:  intrusos  e  posseiros”. In: WELCH, Clifford Andrew; et  alli (Orgs.). Camponeses  brasileiros: leituras  e  interpretações  clássicas. V. 1. São Paulo: Editora UNESP; Brasília, DF: NEAD. (pp. 45-55).

 

O texto de Alberto Passos faz uma síntese dos três séculos de lutas das populações pobres do campo contra os senhores da terra. Observando os quase 400 anos de latifúndio, são descritos os mais variados meios utilizados para impedir que oprimidos e excluídos tivessem acesso a terras. E mesmo quando resistiam, eram expulsas sob justificativa econômica de uma suposta dilatação necessária dos cultivos ou das criações dos grandes senhores. Mesmo quando esses camponeses pobres conquistavam pequenos pedaços de terra para a agricultura de subsistência, o objetivo era único: manter uma reserva de mão-de-obra dentro ou próxima dos latifúndios.

Feita essa introdução, caminhamos para uma análise histórica mais específica, observando como as versões para o aparecimento da pequena propriedade são pouco fundamentadas e como a história escrita até então servia para fortalecer o latifúndio. A exemplo da história construída entorno da colonização estrangeira instituída ao sul durante o século XIX, que tenta ocultar o processo histórico anterior e pregar a divisão de terras como um presente das classes dominantes, supostamente interessadas em dividir parte de seu poder com camponeses pobres. Outro exemplo citado diz respeito ao discurso elitista, popular no final dos oitocentos, de que a camada oprimida da população vivia na preguiça ou “indolência”, sendo incapazes de trabalhar. Como objetivo última dessas histórias, Guimarães localiza o apagamento da história da longa e obstinada batalha da classe camponesa.

Em seguida, passamos a conhecer um pouco melhor das balizas políticas e ideológicas que operaram o fortalecimento da grande propriedade. Primeiro a “colonização sistemática”, que se fundava no princípio de que as terras virgens não deviam ser postas ao alcance das populações pobres por preços baixos para assegurar reservas de braços aos senhores, estabelecendo preços altos para que a terra não pudesse ser adquirida com facilidade pelos pobres do campo. Entretanto, esse princípio só será necessário com a chegada do século XX, pois até então a terra no Brasil era um privilégio de poucos.

Tínhamos, há época do Brasil colonial e mesmo no Império, uma aristocracia rural que não apenas possuía o privilégio de casta sobre a terra, mas dominava e conduzia os meios jurídicos, as doações e as ocupações pela força. Por esse prisma é que se enaltecia a figura do colono, do bandeirante, do caçar de indígenas etc. Entretanto, Guimarães demonstra que mais importante que a figura do colono foi a figura do posseiro ou intruso, principalmente o posseiro ou intruso nativo, que enfrentou ao longo de séculos o poder latifundiário violando "suas draconianas instituições jurídicas" e garantindo cada vez mais significância histórica á posse, que passa a ser percebida como a "arma estratégica de maior alcance e maior eficácia na batalha contra o monopólio da terra". Esses foram os pioneiros da pequena propriedade camponesa, galgando inicialmente as terras de ninguém nos intervalos entre as sesmarias, em seguida as sesmarias abandonadas ou não cultivadas, e por fim, as terras devolutas e latifúndios mal explorados.

Esses "intrusos", indígenas, negros e pobres, resistiram as condições opressivas vigentes nos primeiros séculos, que nada mais faziam além de limitar a expansão da agricultura nos moldes capitalistas (ou alguém conhece uma potência capitalista que não tenha realizado a partilha de suas terras?). Cabe ressaltar, por fim, que esses intrusos nem sempre receberam a devida atenção dos historiadores, sendo retratados diversas vezes nos moldes dos senhores rurais da época: uma multidão de desvalidos, “ociosos” ou “vadios”. Mas que, na realidade, constituíram importante instrumento luta contra o latifundiário desde a segunda metade do século XVIII e por todo o século XIX.

 

 

Fichamento – Grupos domésticos; Coletividades locais

 

MENDRAS,  Henri.  1978.  “Grupos domésticos”; “Coletividades locais”. In: Sociedades  Camponesas,  Rio  de  Janeiro: Zahar. (cap. 3 e 4).

 

Henri Mendras foi fundador da sociologia rural na França, morreu em 5 de novembro de 2003. Estudante da Sorbonne e do Instituto de Estudos Políticos de Paris (onde seguiu os ensinamentos de Georges Gurvitch, Georges Friedmann, Gabriel Le Bras e Jean Stoetzel), conviveu com outros futuros sociólogos de sua geração, que também se tornaram seus amigos mais próximos: Éric de Dampierre, Jean-René Tréanton, Michel Crozier, Jean-Daniel Reynaud, Alain Touraine.

Na obra em estudo, Mendras analisa questões relativas à técnica, regime fundiário, regime financeiro e social (aprendizagem, criação de cooperativas e mútuas de equipamentos agrícolas, compra, venda, gestão etc.).

De acordo com Mendras, da transformação de uma sociedade agrária, subordinada à cidade e à centralidade da burguesia, e não mais à feudalidade, surge o campesinato. Direito a propriedade e dinheiro passam a organizar a sociedade e a vida cotidiana.

As “novas” instituições passam a determinar novas configurações às sociedades camponesas, que podem ser caracterizadas por cinco traços principais: uma relativa autonomia face à sociedade global; a importância estrutural dos grupos domésticos, um sistema econômico de autarcia relativa, uma sociedade de interconhecimentos e a função decisiva dos mediadores entre a sociedade local e a sociedade global.

A autonomia depende da capacidade que o grupo doméstico - e não família - tem de prover a subsistência em dois níveis complementares: a subsistência imediata, isto é, o atendimento às necessidades do grupo doméstico, e a reprodução da família pelas gerações subsequentes. Para tanto, há que se considerar a especificidade de seu sistema de produção e a constituição do patrimônio familiar. A terra enquanto patrimônio garante a perpetuação de uma linhagem, pois se torna a sustentação econômica e, principalmente, moral de uma família.

Pensando nas formas com que os humanos se relacionam com o meio ambiente, desenvolvidas localmente, Mendras propõe a ideia de "habitats" e "sociedades de interconhecimento", onde "todo mundo se conhece”. A designação de um habitat - que é, simultaneamente território, definido por oposição aos territórios vizinhos, e um território construído que serve a seus habitantes de residência, de instrumento de trabalho e de quadro de sociabilidade - nos permite pensar como a terra garante vida e trabalho, com valor imaterial por ser lugar da coletividade local ou da comunidade rural, núcleo organizador da sociabilidade camponesa.

Em resumo, a parte destinada a leitura trata dos temas descritos acima. Porém, se me é permitido abordar questões particulares das pesquisas que tenho desenvolvido, considero importante citar o olhar que Mendras lança sobre a adaptação e a relação entre humano e meio. Cabe destacar a parte inicial do texto, onde o autor lança árduas críticas ao mito da natureza intocada (1978, p. 19): “a natureza virgem não é mais do que um mito criado pela ideologia de civilizados sonhadores de um mundo diferenciado do seu [...]”.

Mais que isso, ele abre brechas para um estudo do que hoje chamamos de agência dos não humanos com passagens como: "A História agrícola da Europa pode ser resumida em uma luta entre a agricultura e a floresta: nos períodos de crescimento demográfico, a floresta retira-se diante do assalto dos homens, mas sempre pronta a reconquistar o território cultivado, esperando um novo assalto" (MENDRAS, 1978, p. 20-21).

 

Textos consultados

FREITAS, Alair Ferreira de; BOTELHO, Maria Izabel Vieira. Campesinato como ordem moral: (re)visitando clássicos e (re)pensando a economia camponesa. Revista NERA Presidente Prudente Ano 14, nº. 19 pp. 44-58 Jul-dez./2011

 

WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. Raízes históricas do campesinato brasileiro. XX Encontro anual da ANPOCS. GT 17. Processos sociais agrários. Caxambu, MG. 1996.

 

“Henri Mendras (1927-2003)”, Rural Studies [Online], 167-168 | 2003, postado em 17 de dezembro de 2004, consultado em 08 de agosto de 2021. URL: http://journals.openedition.org/etudesrurales/2929; DOI: https://doi.org/10.4000/etudesrurales.2929

 

SILVA, Carlos Eduardo Mazzetto. Modo de apropriação da natureza e territorialidade camponesa: revisitando e ressignificando o conceito de campesinato. Geografias. Belo Horizonte 03(1) 46-63 janeiro-junho de 2007.

Fichamento – Tipos de campesinato latino-americano

 

WOLF, Eric W.  2003. “Tipos de Campesinato Latino-Americano:  Uma Discussão Disciplinar”.  In: Antropologia e Poder, Brasília/Campinas: EdUnB/Editora Unicamp.

 

Conhecer a trajetória de Wolf é particularmente interessante para mim, pois, há um ano, quando comecei a me interessar pelas questões ambientais na antropologia eu busquei por autores que não conhecemos em Teoria Antropológica 1 e 2. Foi então que descobri o neoevolucismo e a ecologia cultural. Descobri que o que estudamos nas disciplinas citadas anteriormente é apenas um pedacinho das discussões sobre antropologia que existem pelo globo. Percebi também a influência que o posicionamento político dos autores tinha sobre a sua inclusão ou não nos currículos das matérias teóricas. Que a ecologia cultural era uma vertente em voga entre antropólogos "à esquerda" no espectro político norte americano. Li textos originais de Leslie White, Julian Steward e na sequência, entre os orientandos Roy Rappaport e Eric Wolf, acabei optando pelo primeiro. Fui conhecer um pouco de diferentes interpretações para rituais como expressão social e religiosa de controle sobre o meio ambiente, estudos sobre consumo e produção de calorias, etc. desaguando em alguns brasilianistas como Emílio Moran, já na vertente de estudos da adaptabilidade.

Wolf produziu em paralelo a esses autores, numa linha mais próxima de Gonzalo Aguirre Beltrán e Ángel Palerm, todos numa vertente política socialista. Do diálogo com Sidney Mintz aprofunda-se as investigações sobre o mundo rural com foco nas diversidades locais e os modos diferentes através dos quais pressões capitalistas foram vivenciadas por populações específicas. Esse é o contexto de publicação de "Tipos de Campesinato na América Latina". O objetivo do texto é delimitar uma tipologia de grupos camponeses latino americanos reorientando a investigação antropológica de foco culturalista para dedicar especial atenção à estrutura desses grupos camponeses.

O autor abre mão da caracterização genérica do campesinato e opta por definir camponês como produtor agrícola que retém o controle efetivo de sua terra com fins de subsistência. Afirmando a importância do fator histórico e econômico sobre um cenário local - principalmente em uma América Latina disputada por potências mundiais -, Wolf reforça a importância de observar a relação estrutural da comunidade que os camponeses desenvolvem e reforçam para manter seu núcleo socio cultural integro na medida em que se relaciona com um componente externo maior (a cidade, o mercado, o modo de produção capitalista, etc.). Nesse sentido, para Wolf, é necessário observar os campesinatos como culturais parciais.

Partindo de exemplos de base empírica, Wolf propõe as noções de comunidades corporadas e comunidades abertas. As comunidades corporadas são comumente localizadas em terras altas, normalmente marginais, exploradas por meio de uma tecnologia tradicional (envolvendo predominantemente o componente físico). Esses fatos interferem diretamente sobre a capacidade de produção da comunidade e acabam tendo por consequência a pobreza, reforçada pela limitação da capacidade de consumo de bens externos. Dificilmente o chefe familiar diferencia o que é fruto de seu trabalho de outros tipos de renda. A terra é de propriedade comum, abrindo possibilidade de redistribuição quando necessário. As principais decisões são tomadas dentro do sistema político-religioso apoiado na família nuclear, que define as fronteiras e é fator de coesão social, instituindo mecanismos de nivelação e controle que, no limite, reforçam a integridade da estrutura. É comum a rejeição ao estrangeiro ou forasteiro, com o objetivo último de reduzir a ameaça à integridade da comunidade e expressão a adesão cultural ativa dos membros do grupo camponês.

Já comunidades abertas abarcam várias subculturas, sendo o campesinato apenas uma delas. Essas comunidades produzem com o objetivo de vender. As relações de troca (compra e venda) são construídas a partir de alianças informais entre famílias e clientes. Estão localizadas em planaltos baixos e úmidos ou terras baixas tropicais e há tendencia para ocupação marginal e adoção de tecnologia primitiva (que pode ser alterada a depender do crédito fornecido pelo especulador externo, influenciando também sobre a alternância entre tipos de produção). Há capitalização, mas em pequena escala e intermitente. A interação com o mundo externo é intensa e incentivada, pois os fatores de coesão social são diferentes e a demanda por produtos externos é elevada. Wolf faz uma ressalva para a possibilidade de alternância entre produção para subsistência e produção para venda, a depender das necessidades da comunidade e condições do mercado externo. Essa alternância caracteriza um mecanismo ativo da comunidade. Nos dois casos o ritmo de mudanças é lento.

Por fim, Wolf traz outros cinco tipos de camponeses, mas não os aprofunda pela carência de dados empíricos. Além disso, o autor não exclui a possibilidade de revisão dos tipos definidos, muito menos a possibilidade de descoberta de novos tipos. O ponto principal é a defesa de uma análise baseada no estudo da estrutura da comunidade.

Fichamento - O mundo segundo a Monsanto

 

Esse fichamento trata do filme "O Mundo Segundo A Monsanto" (2008), produzido e lançado em conjunto com o livro de mesmo nome pela diretora e jornalista francesa Marie-Monique Robin, que conta a história da principal fabricante de organismos geneticamente modificados (OGM), cujos grãos de soja, milho e algodão proliferam pelo mundo, apesar dos alertas de vários ambientalistas. O trabalho é fruto de três anos de pesquisa, quando a jornalista catalogou as ações da Monsanto e as relações políticas estabelecidas que permitiram a liderança da multinacional no mercado de sementes.

O filme expõe o papel da Monsanto (maior produtora de sementes do mundo e que, desde 1997, intitula-se uma empresa de agricultura sustentável) como produtora de algumas das toxinas responsáveis por doenças como câncer e demência, e a facilidade como encobertam os problemas e efeitos colaterais que acontecem a partir do contato e/ou uso continuo de seus produtos. Esse fato gerou repulsa do público em geral e do consumidor, em todos os cantos do planeta.

Vemos no documentário os perigos do crescimento exponencial das plantações de transgênicos, que em 2007, cobriam 100 milhões de hectares, com propriedades genéticas patenteadas em 90% pela Monsanto. Inclusive, Robin conta, por meio de uma política de fatos consumados, as autoridades do Brasil e do Paraguai foram obrigadas a legalizar centenas desses hectares plantados com grãos contrabandeados, uma legalização que, obviamente, favoreceu a Monsanto, que assim pôde cobrar os royalties por seus produtos.

Assistimos ao longo dos 109 minutos depoimentos de cientistas, políticos e advogados e informações obtidos em viagens à Grã-Bretanha, Índia, México, Paraguai, Vietnã, Noruega e Itália. Observamos como a influência da Monsanto chegou até mesmo a Casa Branca durante o período de Guerra Fria, com a trajetória pública de Donald Rumsfeld, ex-secretário de Defesa do governo Bush júnior, que dirigiu a divisão farmacêutica da companhia. Outro fato denunciado que comprova essa influência é o de que em 1942, o diretor Charles Thomas e a empresa fizeram parte do Projeto Manhattan, que resultou na produção da bomba atômica.

Pensando em América Latina, Robin descreve como o uso da soja Roundup Ready (RR) aumentou o uso do herbicida Roundup no Brasil e na Argentina. Antes da soja transgênica, a Argentina consumia 1 milhão de litros de glifosato, volume que saltou para 150 milhões em 2005. De lá para cá, a empresa suprimiu os descontos na comercialização do pesticida, aumentando seus lucros.

Outros temas retratados são:

1. a omissão de informação da toxidez do agente laranja durante a guerra do Vietnã;

2. a contaminação inadvertida de operários e consumidores por PCBs, produtos utilizados em transformadores elétricos e tintas industriais e que se acumulam na cadeia alimentar;

3. a ocultação de dados científicos incômodos sobre os efeitos danosos da utilização do herbicida Roundup;

4. e o efeito do consumo de plantas transgênicas na saúde humana e no ambiente.

Porém, o mais impressionante de tudo é descobrir a prática sistemática de ocultação da verdade e outras ações abusivas, em que a empresa confunde o debate público e facilita a aprovação de seus produtos configurando um verdadeiro regime de terror em que há corrupção de funcionários do Estado, perseguição implacável aos opositores e um monstruoso aparato jurídico para blindar a empresa.

 

Referências:

https://www.youtube.com/watch?v=sWxTrKlCMnk

https://diplomatique.org.br/review/o-mundo-segundo-a-monsanto/

https://terradedireitos.org.br/noticias/noticias/o-mundo-segundo-a-monsanto/1145

http://unisinos.br/blogs/ihu/cinema/o-mundo-segundo-monsanto/

https://www.ecodebate.com.br/2012/07/02/o-mundo-segundo-a-monsanto-um-documentario-que-denuncia-a-gigante-dos-transgenicos/

Federalismo e o Sistema Educacional Brasileiro

 

Universidade de Brasília

Organização da Educação Brasileira

Grupo da Educação Profissionalizante

Francisco Octávio Bittencourt de Sousa – 190045809

Raphaela Santana de Sousa – 211025308

 

1-    Solicita-se que o grupo aborde os principais conceitos relativos ao federalismo político e educacional, que foram abordados no texto escrito por Maria Zélia Borba Rocha (2016) e mencionados na entrevista de Fernando Luiz Abrúcio, cujo link está em anexo. (2,0).

O federalismo político brasileiro é definido pela união de membros federados que formam uma unidade soberana: o Estado (União), dividido em unidades federadas subnacionais autônomas (administrativa, legislativa, política e financeiramente). É caracterizado pela divisão entre poderes e descentralização política. Além disso, o federalismo político brasileiro é cooperativo, o que quer dizer que há colaboração recíproca entre os entes federativos. 

O federalismo educacional organiza o ensino brasileiro em sistemas. Como o Estado brasileiro subdivide-se em instâncias autônomas, há um subsistema de ensino em cada instância estatal. As responsabilidades específicas de cada ente federado para com as etapas da educação básica estão configuradas no Texto Maior de 1988: a União organiza o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios; municípios garantem a educação infantil e o ensino fundamental (art. 211, § 2º); estados-membros asseguram o ensino médio e o fundamental (art. 211, § 3º); e o Distrito Federal provê as três etapas da educação básica: infantil, fundamental e médio, porque não pode subdividir-se em municípios (art. 32, caput) e, portanto, assume as responsabilidades dos dois entes federados (estados-membros e municípios) em sua jurisdição.

O federalismo educacional brasileiro também é do tipo cooperativo, o que significa que os entes federados devem trabalhar em conjunto para garantir o dever do Estado para com o ensino, que é prover a educação básica (art. 208, I) para todos os brasileiros, sem distinção de qualquer natureza (art. 5º, 6º, caput). Assim, o acesso à educação básica não pode ser negado sob qualquer hipótese. Um bom exemplo de cooperativismo entre entes federados dado pelo professor Fernando Luiz Abrúcio é o Ceará, onde as esferas estadual e municipal atuam de forma conjunta, obtendo bons resultados em um estado que não consta entre os mais ricos do país.

É importante frisar que a educação é o único direito público subjetivo, ou seja, as autoridades governamentais responsáveis pelo Estado não podem se negar a tomar as providências necessárias para que a educação básica chegue de forma igualitária para todo brasileiro e estrangeiro residente. Para isso, é importante que os entes federados repassem um percentual mínimo da arrecadação tributária anual para a educação. Para a União o percentual mínimo é de 18% e aos municípios 25%. No caso do Distrito Federal, que não pode se subdividir em esfera estadual e municipal, deve repassar o valor de 25%. Os entes federados não podem, em qualquer instância, destinar menos que o valor determinado por lei, o seu descumprimento acomete crime de responsabilidade pública e de responsabilidade fiscal. No entanto, dentro de suas Constituições Estaduais e Lei Orgânica Municipal, os membros da federação e municípios podem repassar valores maiores. Esse repasse é para além de manter escolas funcionando, é para garantir, assegurar e promover a equidade na qualidade de ensino para todos os estudantes no país.   

 

2 -    Na entrevista de Fernando Luiz Abrúcio, o professor e pesquisador faz várias alusões ao Estado do Ceará, como caso exemplar na federação brasileira quanto à educação. Dissertem sobre os fatores que, na visão dele, explicam o caso bem-sucedido e que poderiam servir de exemplo para os demais entes federados (Estados). (1,5).

O professor Fernando Luiz Abrúcio afirma que um dos pontos positivos, para tomar o Ceará exemplo, é o fato das esferas municipal e estadual trabalharem em conjunto, ao contrário do que acontece em outros Estado, em que a heterogeneidade é um problema agudo. Seria necessário, para um sistema de qualidade, que outros entes federados seguissem um plano nacional de educação que vise o diálogo entre a União, Estados e municípios em um regime de colaboração.

Outro ponto destacado pelo pesquisador, é em como as instituições de governo enxergam o aluno de forma superficial, como parte de uma rede específica anulando as diferenças de necessidade, de qualidade e de alcance em cada esfera. O trabalho exemplar no caso do Ceará pode ser explicado por essa união entre governos, em que um é beneficiado pelo outro e todos participam do governo. Foram criados pactos de incentivo, adequados as realidades dos municípios, com um sistema de competição que impulsiona ao desempenho educacional, direcionando uma parte maior do ICMS para municípios que elevaram sua qualidade de ensino.

Ainda dentro desse sistema de cooperação, um outro bom exemplo, é que se mistura competição e cooperação entre esses municípios. Nessa relação de interdependência, os municípios que atingiram as metas de desenvolvimento recebem um prêmio de incentivo, no entanto, apenas se ajudarem os que não conseguiram.

Além disso, um outro ponto importante para esse bom funcionamento é os professores estarem envolvidos de forma direta com as decisões tomadas, serem ouvidos e poderem sugerir soluções que atendam às necessidades sociais que cada município enfrenta. Isso tudo, vale lembrar, sem ter as mesmas condições que outros Estados mais ricos.

Nesse modelo, diferente do que conhecemos, o Estado, como entidade maior, não se posiciona de forma autoritária em relação a esfera municipal, sem conhecer ou entender sua realidade. Ao contrário, ele trabalha com essas lideranças buscando a equanimidade na qualidade de ensino ofertada.

 

3 – De acordo com Rocha (2016), quais são os principais problemas que decorrem da existência de múltiplos sistemas educacionais no Brasil? Quais são as propostas sugeridas pela autora para organização do ensino brasileiro? (1,5).

Três são as principais críticas a essa organização federativa da educação formal brasileira: (1) a desigualdade de arrecadação tributária entre os entes federados; (2) a inexistência de um sistema nacional de educação articulado; (3) o fato de que a municipalização e a estadualização da educação básica não garantem a sua universalização, não asseguram a existência de um padrão mínimo nacional de qualidade, nem possibilitam a efetividade da educação básica como direito público subjetivo.

Quanto a primeira, no texto é dito que para alguns autores a saída passa por instaurar o federalismo cooperativo na esfera tributária, invertendo a lógica atual em que os entes subnacionais respondem pela maioria absoluta dos gastos estatais com o ensino.

Quanto a segunda, é sugerido no texto a criação de um órgão que coordene as atividades nacionalmente, de modo a superar o isolamento a que muitos municípios foram condenados pela autonomia política, administrativa e financeira de cada ente federado.

Quanto a terceira, que seria uma síntese das outras duas, alguns autores sugerem a federalização da educação básica, o que significa passá-la para a responsabilidade da União, já que, nos dispositivos legais, esta não é responsável por garantir e/ou assegurar qualquer nível, etapa e modalidade de ensino diretamente.

Sendo assim, há duas propostas que buscam um novo desenho organizacional para a estrutura educacional brasileira que possibilite efetivar a universalização da educação básica e que permita operacionalizar um ensino de qualidade a todos os brasileiros: (1) manter o federalismo cooperativo, refazendo a distribuição dos recursos financeiros e criando órgãos que permitam a coordenação articulada do Sistema Nacional de Educação; ou (2) federalizar toda a educação básica, transferindo-a para a responsabilidade da instância federal do Estado – a União

 

Referências

ROCHA, Maria Zélia Borba. A organização federativa do ensino brasileiro. ROCHA, Maria Zélia Borba, PIMENTEL, Nara Pimentel (Orgs). Organização da educação brasileira: marcos contemporâneos.  Brasília: Editora UnB, 2016. p. 15 a 58.

 

Entrevista com Fernando Luiz Abrúcio. Canal UM BRASIL. 7 de dez. de 2017. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=4QEgL0mg7K8&ab_channel=CanalUMBRASIL. Consultado em 30/08/2021.

 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

Público e o Privado e a Laicidade do Estado e da Educação

 

Universidade de Brasília

Organização da Educação Brasileira

Grupo da Educação Profissionalizante

Francisco Octávio Bittencourt de Sousa – 190045809

Raphaela Santana de Sousa – 211025308

 

1)    Conforme a legislação vigente e o texto de Melo (2016), quais são as diferenças entre escolas públicas e privadas? Como são classificados os estabelecimentos educacionais privados? Quais são as condições para que estes estabelecimentos possam receber recursos públicos diretos e indiretos? (1,5)

As principais diferenças entre escolas públicas e privadas, de acordo com o Art. 19 da LDB/96, podem ser resumidas nos seguintes pontos: enquanto as escolas públicas são um patrimônio coletivo (de todos os cidadãos) mantidas por entes públicos (cidades, estados ou União) através da receita gerada pelos impostos, as escolas privadas são patrimônio uma pessoa física ou jurídica que detém direitos privados e são mantidas através de recursos como taxas de matrícula e mensalidades.

 As escolas privadas podem ainda ser classificadas em diferentes categorias administrativas, de acordo com o Art. 20 (LDB/96), sendo elas: Comunitárias (instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas educacionais, sem fins lucrativos, que incluam na sua entidade mantenedora representantes da comunidade); Confessionais (instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas que atendem a orientação confessional e ideologia específicas) ou Filantrópicas (regidas pela Lei nº 9.732. de 11 de dezembro de 1998).

Cabe destacar que essas duas últimas (escolas confessionais e filantrópicas) podem receber recursos públicos diretos e indiretos, de acordo com o Art.213 da CF/88, desde que: I - comprovem finalidade não lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação; II - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades; ou III - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades.

No mesmo artigo da CF (art. 213, parágrafo primeiro) há possibilidade de recurso público através de bolsas de estudo para o ensino fundamental e médio, na forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares da rede pública na localidade da residência do educando.

 

2)    Relate experiências no seu cotidiano escolar em escolas públicas ou privadas (como aluno, estagiário ou professor) nas quais ocorre a flexibilização/diluição das fronteiras entre as esferas pública e privada abordadas pelo texto básico. (1,0)

Em escolas públicas é comum que haja carência de materiais didáticos e de estrutura para determinadas atividades. No ano de 2012, quando ainda estava no ensino fundamental, minha então escola pretendia oferecer para alguns alunos um curso de informática que seria ministrado por uma empresa privada. Haviam regras para que os alunos pudessem ganhar uma bolsa, exigências comuns, e estes deveriam ter boas notas e participar de uma prova ao final. Óbvio que muitos alunos se interessaram, acesso à computadores era ainda muito difícil, então a escola junto com a empresa decidiu tentar investir em algum projeto que beneficiasse a ambos como um todo. O que me lembro muito é que logo após isso a sala de informática, que ficou fechada por anos, foi reformada e alunos e professores puderam ter acesso. A empresa investia em bolsas parciais, a metade do preço, de acordo com o desempenho do aluno na prova e a escola recebia apoio financeiro para recriar um ambiente quase inutilizado e inacessível (Relato de Raphaela).

 

3)    De acordo com Cunha (2018), a partir da promulgação da CF/1988, a escola pública tornou-se “uma arena de disputa religiosa, nem sempre silenciosa.” Redija um texto apontando os elementos que levam o autor a essa conclusão e quais as possíveis soluções apontadas por ele para o problema (1,5).

De acordo com Cunha (2018), a partir da promulgação da CF/1988, a escola pública tornou-se “uma arena de disputa religiosa, nem sempre silenciosa” a partir de alguns pontos aqui destacados: o § 1º do art. 210 da CF/88, que estabelece que as escolas deverão ter, obrigatoriamente, como matrícula facultativa, porém dentro do horário normal de aulas, uma cadeira relacionada ao ensino religioso. O problema é que a CF/88 não trata de padrões de conduta para o administrador ou dos educadores com relação à forma que se dará o ensino religioso, seu conteúdo ou sobre o que farão as crianças que não optarem pelo ensino religioso durante o período em que estiverem sendo ministradas as aulas relacionadas à matéria. A verdade é que essa "livre interpretação" abre brechas para práticas religiosas clandestinas (orações antes das aulas, painéis etc.) e, somada aos conteúdos dos livros didáticos, que por vezes constituem um repositório de concepções discriminatórias, obtém-se como resultado um certo proselitismo em que se cultiva a crença de que a vida boa exige alguma religião e prega certa superioridade - que não existe - da aliança cristã (católica + evangélica) sobre o espiritismo kardecista e as religiões afro-brasileiras.

As soluções propostas por Cunha (2018) passam pela renúncia dos católicos e evangélicos à disciplina ensino religioso nas escolas públicas e ao fim do proselitismo ostensivo ou dissimulado. Como medida institucional, nos é afirmado pelo autor a necessidade de suprimir da CF/88 o § 1º do art. 210, fazendo valer a ideia de que “Será laico o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos” (art. 72, § 6º). Com isso, os problemas listados no parágrafo anterior - como as práticas religiosas clandestinas (orações antes das aulas, painéis etc.) - serão findadas gradativamente.

 

4)    Acrescente ainda, pelo menos dois exemplos de experiências vividas em escolas públicas, seja como alunos (as), estagiários (as) ou professores, em que se verifica na prática escolar alguma inconformidade ou violação da legislação vigente sobre o tema da laicidade do ensino (1,0).

Tenho uma lembrança recente de que no ensino médio um colega tentou abrir uma cédula evangélica dentro do IF. Alguns outros alunos começaram a participar dos cultos, que ocorriam “clandestinamente”, em salas de aulas desocupadas ou nos laboratórios. Uma denúncia chegou ao Apoio e o aluno que “presidia” os cultos tomou uma advertência. Isso gerou uma certa comoção entre os outros participantes, inclusive iniciando uma “perseguição” a alguns professores vistos como “de esquerda” (Relato de Chico).

Quando estava no ensino médio, em escola pública e que leva o nome do patrono da educação, lembro de muitos momentos em que houve conflito quanto ao caráter laico do Estado. Um questionamento diário de muitos alunos era o porquê de haver a imagem de uma santa, não sei qual, na porta de entrada e que era muito chamativa. Se o Estado era laico, em tese, não deveria haver imagem de figura religiosa ali fosse qual fosse a religião. Também nessa mesma escola começou uma onda de células e cultos, PERMITIDOS PELA ESCOLA, de religiões “mais aceitas pela sociedade” que causaram muitas brigas entre alunos e professores já que para outras religiões o culto era proibido. A escola disponibilizou uma sala para a realização desses cultos, que virou quase uma igreja, e aos alunos de religiões de matriz africana, por exemplo, não era permitido nenhum tipo de manifestação (Relato de Raphaela).

 

Referências

MELO, Adriana Almeida Sales de Aspectos da coexistência entre educação pública e privada no Brasil de hoje. ROCHA, Maria Zélia Borba. A organização federativa do ensino brasileiro. In: ROCHA, Maria Zélia Borba, PIMENTEL, Nara Pimentel (Orgs). Organização da educação brasileira: marcos contemporâneos. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2016. p. 137 a 169.

CUNHA, Luiz Antônio. Três Décadas de Conflitos em torno do Ensino Público: Laico ou Religioso? Educação e Sociedade, v. v. 39, p. 890-907, 2018.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB. 9394/1996.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

Analise do livro didático “Sociologia hoje”

 

Universidade de Brasília

Didática Fundamental

Francisco Octávio Bittencourt de Sousa – 190045809

 

Analise do livro didático “Sociologia hoje”

 

MACHADO, Igor José de Renó; AMORIM, Henrique; BARROS, Celso Rocha de. Sociologia hoje. São Paulo: Ática, 2016.

 

O livro escolhido para análise foi o "Sociologia hoje", PNLD 2015-2017, para alunos do 1° ao 3° ano do ensino médio, de autoria de Igor José de Renó Machado, Henrique Amorim e Celso Rocha de Barros; publicado pela Editora Ática, 1° edição, São Paulo, 2016.

Antes de adentrar na análise propriamente dita preciso contar um pouco da história de como esse livro chegou até mim. Na realidade, ele foi um presente de um "professor inspirador" que hoje se tornou praticamente um padrinho: prof. José Geraldo (IF Goiano - Campus Trindade). Ele leciona Sociologia para o ensino médio no IF e foi uma das pessoas mais me apoiou a ingressar na área de estudos que hoje ocupo. Esse livro em especial marcou uma virada na minha graduação, pois recebi de presente no primeiro semestre, quando estava tendo as disciplinas introdutórias de Antropologia, Ciência Política e Sociologia. Esse foi o primeiro livro para o ensino médio que vi apresentar a divisão entre essas três divisões das ciências sociais. Me encantei em especial pela antropologia (por forte influência do livro, que até hoje constitui fonte importante para pesquisas bibliográficas iniciais). Dessa forma, é com grande satisfação que faço essa análise.

Logo na apresentação do livro (p.3) é dito pelos autores que "o principal objetivo deste livro é aproximar as investigações, reflexões e teorias das Ciências Sociais do seu cotidiano, como um instrumento de reflexão crítica" e isso realmente acontece, principalmente quando observando os boxes "Você já pensou nisto?" que são seções onde perguntas são feitas tentando aproximar os temas estudados do mundo ao redor do leitor, destacando questões e problemas do cotidiano. Dentre esses boxes, um dos meus preferidos se encontra na página 278, onde podemos encontrar a seguinte reflexão:

"Nós vivemos na mesma cultura que os políticos corruptos, e é provável que tenhamos alguns hábitos semelhantes aos deles, por mais que nos incomode reconhecer isso. Muitas vezes desrespeitamos a lei em situações aparentemente sem importância, com infrações de trânsito, crimes contra a limpeza pública (jogar lixo na rua, por exemplo), e pequenas tentativas de levar vantagem sobre os outros. Será que isso não explica parte da nossa tolerância com políticos corruptos? Afinal, alguns deles são eleitos mesmo depois de comprovadas as denúncias contra eles. Se nos preocupássemos mais com nosso comportamento, isso não aumentaria nossa disposição para cobrar como cidadãos, e assim contribuir para o fim da corrupção?"

Se pararmos para analisar o contexto político de 2016 e a maré anticorrupção que dava sustentação a mega operações de combate a corrupção que iam muito além das atribuições e permissões dadas as instituições responsáveis pela garantia da justiça que, no limite, culminou no golpe que derrubou uma presidenta eleita e na ascensão de uma extrema direita fascista com pauta apoiada nessa ideologia antipolítica, torna-se nítida a necessidade de reflexões como a trazida pelos autores.

E essa "interação" entre conteúdo e cotidiano não se dá apenas nos boxes "Você já pensou nisto?". Diversos conteúdos são ilustrados com situações do cotidiano político e social do país a exemplo as imagens do julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade de reserva de vagas em universidades públicas, com base no sistema de cotas raciais da Universidade de Brasília (p.20), cuja decisão hoje faz parte do dia a dia de diversos alunos dessa turma de Didática Fundamental, usadas ao longo do tópico "Informações e pensamento crítico".

Em outras partes do livro há um verdadeiro "chamamento ao estranhamento", pegando exemplos corriqueiros que escutamos quando criança, como é o caso da expressão "índio de verdade" descontruída na página 37, demonstrando como a ideologia entremeada nessa expressão legitima a retirada de direitos dos indígenas desqualificando suas reinvindicações. 

Os exercícios do livro reforçam esse "chamamento ao estranhamento" de maneira geral, pois, apesar de contar com uma parte inicial mecânica (de memorização), intitulada "Revendo" que trabalha com a ideia de retomar e recortar partes específicas da leitura; há outros dois blocos de questões ("Interagindo" e "Contraponto") cujo objetivo aparente é promover a conscientização e postura crítica em relação ao conteúdo, trazendo - por exemplo - na página 42 um adesivo de carro representando uma família (heteronormativa) para questionar a ideia de "família" que aquele simples adesivo representa ou, na página 43, trazendo o poema "O fardo do homem branco" (texto que só fui conhecer na graduação) para pensar colonialidade. De maneira geral, o livro cumpre com o objetivo de fixar o conteúdo tanto para alunos que tem maior facilidade com memorização tanto para os que se dão bem com interpretação e aplicação.

Considerando toda a explanação realizada até o momento, é correto afirmar que o livro se aproxima da tendência pedagógica HISTÓRICO-CRÍTICA, cujo representante teórico estudado é o professor Dermeval Saviani. Fica evidente pelos exemplos dados e mesmo sem uma leitura muito aprofundada do livro que há uma defesa enfática de que o papel da escola é contribuir com o processo de construção e consolidação de outro modelo social (recordo das questões sobre a cultura da corrupção, por exemplo). Problematizando questões como as cotas raciais e a colonialidade, destaca-se o fato de que o livro preza pela igualdade de direitos, oportunidades, cooperação e justiça social; visando, no limite, transformar a realidade, elementos constitutivos da tendência histórico-crítica.

 

 

Carta sobre GTAQ

 Carta sobre GTAQ As comunidades quilombolas são constituídas por pessoas que compartilham uma identidade forjada ao longo de processos hist...