terça-feira, 27 de agosto de 2019

(TEXTO MERAMENTE OPINATIVO) Seria Jhon Stuart Mill comunista?

TEXTO MERAMENTE OPINATIVO.


MILL, John Stuart. Utilitarismo. São Paulo: Editora Escala, 2007.
TORRES, André Castelo Branco Alves. O UTILITARISMO É UM ASCETICISMO. 2017. 192 f. Tese (Doutorado) - Curso de Graduação em Filosofia, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2017.

 Seria Jhon Stuart Mill comunista?
“Na regra de ouro de Jesus de Nazaré podemos encontrar o espírito da ética utilitarista em sua plenitude. Fazer aos outros o que gostaríamos que nos fosse feito e amar ao próximo como a nós próprios constituem a perfeição ideal da moral utilitarista.” (MILL, 2007).

Já adianto que não. Recentemente tive que ler mais profundamente sobre o utilitarismo, mais especificamente o utilitarismo inglês, que tem como representante John Stuart Mill. Não há possibilidade de falar de J.S.M. sem pensar em liberalismo, mas ao observar uma obra muito específica desse autor surgiu-me a dúvida ele realmente estaria numa linha política a direita. No livro, de título muito criativo, “Utilitarismo”, de 1861, Mill apresenta a práxis utilitarista, cujos princípios são empregados também no liberalismo novecentista.
“Neste projeto, a exclusão da presença de Deus é um dos pilares do sistema. Para os membros deste movimento filosófico: “não podemos contar com uma divindade que tornará o mundo harmonioso para nós, quer nesta vida, ou em outra. Cabe a nós tornar o mundo moral harmonioso”’ (TORRES, 2017).

A minha dúvida poderia habitar a cabeça de muitas outras pessoas. Num primeiro momento supus “Mill é um comunista incompreendido!”, mas após debater com alguns professores cheguei a uma outra conclusão um tanto quanto assustadora. Mill é liberal, mas não é o que se popularizou hoje (século XXI) como liberal.
“Todas as leis devem provar que possuem razões de maior benefício para sua criação do que o peso dado às razões que existem contra elas [...] não existe nenhuma ocasião em que uma pessoa não tenha motivos para promover a felicidade de outras” (MILL, 2007).

Pensamos a política de maneira binária, algo extremamente simplista, e de algum tempo pra cá, colocamos a esquerda como representante de toda a esfera social, dos direitos humanos, de maconha, de aborto, de lei trabalhista, do marxismo. Já a direita é quem privatiza, quem corta gasto, quem trabalha para o mercado abrindo mão da saúde e do bem-estar da população. Quem é de esquerda demoniza quem é de direita, e o contrário também acontece.
“Os maiores obstáculos para que tal projeto não se concretizasse seriam a carência educacional, e a estrutura social perpetuadora de desigualdades” (TORRES, 2017).

Mas na realidade, essa visão maniqueísta em si já é suficientemente negativa, só que modificou-se de tal forma o liberalismo, que da essência utilitarista de Mill ele não tem nada, ou tem tão pouco que é imperceptível. Mill e outros liberais de seu tempo defendiam bandeiras que hoje são de “esquerdopatas”, como: igualdade, reforma agraria, fim de privilégios, cooperativismo em detrimento da competição, o bem-estar social.
“O desenvolvimento das instituições, fomentadas com o propósito utilitarista, tende a diminuir os efeitos do sofrimento da comunidade ao longo do tempo, e para que tais instituições ganhassem força também seria vital a conscientização do indivíduo, eis a função educativa, pois deveria haver um discurso afinado entre as partes, assim como um certo sacrifício das camadas mais abastadas” (TORRES, 2017).

Hoje em dia Mill seria comunista. É um tanto quanto anacrônico, mas é a minha conclusão. O liberalismo do século XXI é um monstro, é uma distorção do termo que ofenderia qualquer liberal que tenha lido Mill, e o mais preocupante é que esse liberalismo ganha mais e mais seguidores exatamente por ser essa anomalia suicida para qualquer país. É próximo do que Schumpeter fez com o termo “democracia”. Num discurso de manutenção de “direitos individuais”, desumanizou-se completamente a política, que tem por essência resolver os problemas humanos, garantir o bem-estar social.
“Sofrimento e sacrifício nunca seriam bens em si, entretanto estes poderiam ser perfeitamente plausíveis se tendessem a produzir mais felicidade do que sofrimento à comunidade” (MILL, 2007).

Temos que acabar com o discurso de que direitos humanos é coisa de esquerda, que combate a desigualdade é coisa de esquerda, que lei trabalhista é coisa de esquerda. Não é SÓ de esquerda, é coisa de gente, de política, de ciência, de tudo. Não se deve fazer política tirando o fator humano da balança de decisões, se não você mata, direta ou indiretamente. Isso que chamam de liberalismo hoje é política de morte, de seleção de quem pode ou não viver, quem pode ou não ter condições dignas de vida. Não se governa pra maioria, nem pra minoria, se governa pra todos.
“A ação seria eticamente válida pelo fato de contrabalancear não apenas os ganhos unicamente particulares, mas a felicidade da coletividade. Do mesmo modo, seria benevolente quando as camadas mais privilegiadas abrissem mão de um egoísmo infrutífero, para viabilizarem projetos que desenvolvessem as demais” (TORRES, 2017).

Vamos refletir sobre o que acreditamos e como isso impacta as outras pessoas. Liberais de 2018, leiam os clássicos antes de ler Mises ou de afirmar ser “liberal na economia e conservador nos costumes”, leiam Mill, Smith, Ricardo, leiam Marx pra criticar. Parem de repetir qualquer idiotice que escutam, leiam e tirem suas conclusões, vocês são capazes. Não consigo acreditar que um terço dos brasileiros é misógino, racista, machista, anarcocapitalistas, xenofóbicos, homofóbicos. Leiam, não doí. Por um dia parem de compartilhar notícia falsa no whatsapp, baixem um livro e leiam.

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