RELATÓRIO:
POLÍTICA INDIGENISTA BRASILEIRA, ENIO CORDEIRO
(INTRODUÇÃO
E CAP. III: O INDÍGENA E A REPÚBLICA)
FRANCISCO OCTÁVIO
BITTENCOURT DE SOUSA
O livro do prof. Enio
Cordeiro é muito voltado para política internacional e as interpretações
exteriores que se construíam sobre o Brasil e a sua legislação quanto ao
indígena.
O texto é interessante
por trazer a complexa representação do índio que estava sendo montada na República.
O notório antropólogo Lévi-Strauss, antes da vinda ao Brasil, ouviu de um
embaixador brasileiro em Paris que “os índios do Brasil haviam desaparecido a
muitos anos”. Uma clara demonstração de desconhecimento da situação do país,
mas que deixa claro qual a interpretação da alta cúpula política no período: o
apagamento.
Poucos anos antes da
proclamação da República, o relatório de um presidente de província já deixara
bem claro o que era ser índio e qual o tratamento dar e esses: “a única maneira
realmente eficaz seria obrigar esses assassinos e filhos de bárbaros a deixarem
a floresta, localizando-os em lugares dos quais não pudessem fugir [...]”. A
afirmação é curiosa pela ambivalência: ao mesmo tempo que o índio aparece como
assassino e bárbaro, é também um resistente e forte, pois ainda mantem o
domínio sobre as florestas.
Cartas de 1905 sobre a
Estrada de Ferro Noroeste do Brasil demonstram que o índio ainda é visto como
resistente, pois está em constante conflito com os sertanejos, morrendo e matando.
Esse paradigma do índio assassino e bárbaro resiste, a nível nacional, pelo
menos até a chegada de Rondom e os projetos inaugurados por esse. Pós missões
Rondom, o índio não é mais, de maneira geral, o selvagem agressivo: agora ele
está “disposto a confraternizar com a civilização”.
Todavia, permaneceram
ideias de que o índio era empecilho a “marcha inexorável do progresso” e
“incapazes de abraçar a civilização”. Outro grupo defendia a continuidade da
catequização e o assistencialismo, grupo subdividido na linha religiosa e na
linha leiga.
A legislação nacional
acabou por traçar uma linha média, reconhecendo em parte a autonomia política
dos indígenas e retirando a obrigatoriedade da catequização, essa só ocorreria
caso fosse de desejo dos próprios índios. Outro ponto é que os povos indígenas
estariam agora sob proteção federal.
Em 1910, com a fundação
do Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais
(SPILTN), a legislação muda outra vez, retirando agora a orientação para uma
catequização religiosa. A orientação era voltada apenas para a proteção leiga
do estado, que deveria “estimular a lavoura, introduzir a pecuária e propiciar
instrução técnica e primária”. A imagem que se almejava para o índio era o
apagamento de seu estilo de vida e a transformação desse em um pequeno
camponês. Essa ideia, apesar das varias mudanças na legislação, é mantida e
atualizada: o índio deveria ser transformado de forma rápida em um trabalhador
nacional. O Código Civil reforça esse pressuposto indiretamente ao afirmar uma
“incapacidade relativa” dos nativos, que deveriam ser inseridos em um regime
tutelar com legislação especial que seria retirada assim que o índio se
adaptasse a civilização.
FONTE
CORDEIRO,
Enio (1999). Política Indigenista Brasileira e Promoção Internacional dos
Direitos das Populações Indígenas. Coleção Curso de Altos Estudos do Instituto
Rio Branco. Brasília: Instituto Rio Branco/Fundação Alexandre Gusmão/Centro de
Estudos Estratégicos.
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